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“Se nos fosse dado conhecer o sentido de algumas obras que nasceram do descompasso entre o autor e seu tempo, obras que, remando contra a maré, afastaram-se das diretrizes predominantes do ambiente literário a que pertenciam, provavelmente os textos do gaúcho Qorpo-Santo mereceriam destaque em uma vertente “fora do esquadro”, que desde a poesia picaresca de Gregório de Matos fornece dados para a formação de uma tradição caracterizada pelas vias da negatividade e da desconstrução, ganhando registro em alguns autores responsáveis pela renovação da escrita literária brasileira em momentos distintos da sua formação. Como fonte privilegiada para o estabelecimento de uma dicção poética na contramão dos cânones oficiais da literatura, os gêneros cômicos e, em especial, o nonsense forneceriam o suporte para uma composição de verso livre que, no fundo, procurava subverter as formas discursivas dominantes e numa etapa posterior, propiciariam o aparecimento de obras paradigmáticas do novo perfil de modernidade que o país necessitava conquistar. [...]
Alguns desses procedimentos antecipariam, de forma ainda embrionária, as experiências mais radicais dos poetas modernistas brasileiros como, por exemplo, a escrita automática, o verso livre, as revelações do inconsciente e as combinações e colagens de fragmentos textuais dissonantes, experiências essas que ficaram para sempre associadas aos artistas dos movimentos dadaísta e surrealista. No caso brasileiro, esses elementos constituiriam uma vertente do desvio, confirmando, dentre outras coisas, algumas das fontes de pesquisa e investigação poética presentes em autores como Oswald de Andrade.”
(Denise Espírito Santo. “A poesia nonsense de Qorpo-Santo”. In: Qorpo-Santo.Poemas. Organização de Denise Espírito Santo. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, 2000)

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